quarta-feira, 1 de novembro de 2017

FOI ASSIM QUE LHE EXPLIQUEI QUE O AVÔ MORREU.

Tínha-vos prometido este artigo. Como o prometido é devido ... ora cá está!

O avô João faleceu há sensivelmente quatro meses e, como infelizmente antecipávamos, tínhamos que dar a notícia aos meninos em especial ao Joãozinho de cinco anos. 

A causa da morte foi oncológica. Como imaginam, prolongou-se no tempo o que até nos permitiu o ir "preparando" devagarinho. Desta forma, conseguimos pô-lo a par das alterações pelas quais o avô estava e ia passar. 

Sempre lhe contámos tudo. Tudo à medida do que os seus cinco anos e a sua curiosidade conseguem compreender. 

Este é, se quiserem, um dos "truques". Contarmos-lhe sempre a verdade sem fantasiar, sem exagerar mas também sem contar todos os pormenores. Apenas os suficientes para poder responder às perguntas que a sua pequena cabecinha e a sua grande imaginação (própria da idade) lhe iam suscitando. 

Explicamos-lhe que o avô estava doente, que tinha que ir várias vezes a Lisboa fazer tratamentos, que era natural que tivesse menos energia e que o cabelo lhe ia cair.

Com calma e "serenidade" passamos / passaram em conjunto por todo este processo de evolução. 

O avô porque foi das poucas pessoas a quem vi conseguir colocar a doença no seu devido lugar fazendo até ao seu último dia a vida normal e o João porque sempre soube aceitar que as transformações iam ocorrendo e que, a partir dessa altura, os dias seriam assim. 

com compaixão. 

O tempo foi passando (este foi outro aspecto a nosso favor - o facto de não ser uma situação inesperada) e passou, passou até que chegou o dia... o dia em que tive que Lhes dizer.  Aos três.

......

Estávamos de férias numa atividade com os miúdos quando o telefone tocou. Ainda por cima naquela tarde, ao contrário do que muitas vezes é habitual, não tinha o telefone comigo. Quando vi as chamadas .... Eu sabia. Imaginava o que seria. Não foram precisas muitas palavras para perceber. O avô tinha piorado e estava muito muito doente.

......

Cheguei ao pé do pai e dei-lhe um abraço, pedi-lhe que fosse buscar o carro enquanto eu num instante ia ao quarto "atirar" com tudo para dentro das malas. Foi assim que fizemos. O João e o Pedro ficaram com os animadores e em pouco tempo estávamos enfiados no carro. 

.......

No carro disse ao João que como tínhamos andado a conversar o avô estava doente - tinha piorado- e por essa razão tínhamos que ir embora. As férias teriam que terminar. Ele aceitou. Aceitou resignadamente e os dois vieram sem confusão toda a viagem. Colaboraram maravilhosamente bem. Sabiam. Esforcei-me por mantermos dentro do possível as nossas rotinas e o que era habitual nas nossas viagens de carro. Jogámos jogos de palavras, jogos com profissões, cantámos e passadas 6 horas consecutivas chegámos a casa.  O Pedro dormia. Ao João, expliquei que eu e o pai tínhamos que ir ver o avô e por essa razão teria que fica em casa com os outros avós.

.......

De madrugada, nessa mesmo noite, estávamos no hospital. O avô "estava à nossa espera" (é bom pensar assim!!). Fálamos por instantes com Ele, dêmos-lhe água e mostramos-lhe os vídeos dos seus pequenos na praia. Já tinha as fotografias dos netos no ecrã do telemóvel. As lágrimas caiam, claro. Despedimo-nos e fomos para casa com a certeza Eu e Ele que seria a última vez que estaríamos desta maneira. E foi.

......

De manhã o telefone tocou. O nosso coração já sabia. Nesse dia vim buscar o João. Expliquei-lhe que o avô João tinha morrido e que era o dia de se despedir. Conversámos sobre os amigos que também já tinham perdido os avós e surpreendentemente  foi Ele que me contou o episódio do Simba quando perdeu o pai. Não podia ter corrido melhor. Falámos sobre quem ia encontrar  quando chegássemos e o que iria acontecer.

Dormimos.

Chegou o dia do funeral.
Apesar de alguns familiares não partilharem da ideia de o João ir ao funeral Ele foi. Era assim que deveria ser. Era assim que eu considerava melhor, como mãe e como psicóloga, era assim que Ele queria e era para isso que o tinha andado a "preparar". 

Eu sabia que ele compreendia, que precisava e que estava preparado. e foi. E correu bem. Muito bem.

.....

Nessa manhã depois do pequeno-almoço conversámos novamente Eu e Ele sobre como o dia ia correr. Conversámos novamente sobre quem ia estar, o que ia fazer, quando o ia buscar para ir ter comigo à igreja, quem ia encontrar, como iam estar as pessoas, como o iriam abordar, tudo. Tentei dar-lhe toda a informação possível. Descrevi-lhe tudo ao pormenor. - Por incrível que pareça nessa manhã deu o episódio de despedida do Simba do rei.

Fui buscá-lo e fomos para a igreja. Ia sereno. À entrada apertou-me a mão. (Tinha pedido aos presentes para estar tudo calmo) aquando da nossa chegada. Entrámos. Todos os olhares foram para Ele e Ele aguentou-se "à altura". (como se isto existisse!) Entrámos, viu a fotografia do avô (o caixão estava fechado), deixou as flores que tínhamos encomendado e deu um beijinho. Estivemos um bocadinho e quando Ele assim o entendeu, saímos. Dei-lhe um beijinho e foi com a madrinha ao parque.

À noite voltamos a conversar. E chorou. E chorámos. Foi bom. Na sua representação mental o avô foi feliz e tinha muitos amigos. A sala estava repleta de Flores. E é verdade. Tão verdade.

Foi isto.

Um obrigado especial a Todos, sem exceção,
A todos os que nos apoiaram, 
A todos os que nos ajudaram com os meninos, 
A toda a equipa do Hospital de Aveiro,
A toda a equipa da Fundação Champalimaud.


ASPETOS A CONSIDERAR NA COMUNICAÇÃO DA MORTE ÀS CRIANÇAS:

- Propiciar um ambiente calmo e seguro;

- Falar a verdade à medida da sua compreensão e da sua curiosidade;

- Transmitir a ideia da morte como um processo natural;

- Utilizar uma linguagem clara e simples;

- Não mentir nem inventar histórias;

- Não dizer que a pessoa que morreu vai para o céu ou passou a ser uma estrelinha (eu sei que no senso comum é isto que se faz com a melhor das intenções mas não ajuda na elaboração do processo de luto);

- Se a criança tiver vontade e se os adultos significativos considerarem que não é desorganizador pela natureza do funeral, as crianças devem ir -  as despedidas são extremamente importantes no processo de luto;

Um beijinho nosso,
Um beijinho em especial hoje a Eles e à Avó SiSi!
Para sempre no nosso coração.

EueEles * Nós * EueVocÊs





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